segunda-feira, 14 de dezembro de 2015

A Voz do Buraco

Eu Sou o Buraco,
A treva iluminada,
O som silencioso,
O olho e a luz,
A porta e a batida,
O galho e a raiz,
A neve e o gato,
Ordem e caos:
Estou em ti,
Tu em mim,
Eu Sou o Buraco

Portas

Todas as portas se abriram,
Ninguém mais bateu

O pescador sem rede

E o pescador,
Vendo sua tolice,
Largou a rede,
E pescou a vida

O melhor cego

Abri os olhos,
Não vi a luz:
Estou cego,
Eu sei

Encontros

O escudo foi cortado,
A espada se rompeu;
A água viva
Apagou o fogo

A chave de fenda

E o martelo,
Ao despertar,
Viu os parafusos
E se transformou em chave de fenda

Descida

O tolo desceu a montanha,
E chegou ao topo;
Buscou as raízes,
Entendeu os galhos;
Procurou o tolo,
Encontrou o sábio

No Buraco

O tolo caiu no buraco
Se perdeu, se achou
Saiu do Buraco
E agora era sábio

O tolo e o sábio

Entre o tolo e o sábio,
Conversa não houve:
Um não podia falar,
Outro não queria ouvir

O sábio

Era grande sábio,
Maior que todos:
Ouvia luzes
Via sons,
Com olhos surdos
E ouvidos cegos

O pior cego

Não, não há!
Não há luz!
Sei disso,
Fechei os olhos!

A árvore

De árvore tão grande,
Ninguém sabia:
Os galhos pareciam raízes?
As raízes pareciam galhos?

O martelo

E o pobre martelo,
Tão desesperado,
Transformou em pregos
Todos os parafusos

Portas

Um bateu à porta,
Mas ninguém abriu;
Outro abriu a porta,
Mas ninguém bateu:
As portas estavam trocadas

Desencontros

O escudo que nada rompe,
Encontrou espada que tudo corta;
O fogo sombrio
Queimava a água ardente

O pescador e a rede

Era rede tão grande,
Que pescava universos;
A malha tão larga,
Que todo universo escapava

O olho

O olho que tudo vê,
Tudo via,
Menos a si mesmo:
O olho tudo vê?

Consciências

O morto parecia dormir,
O sonâmbulo parecia vivo,
O vivo parecia morto,
O desperto fechava os olhos

O fim

Na chuva seca
Caía terra molhada,
Deixando rastro de fogo
Na luz sombria

Com silencioso estrépito
A matéria beijava a antimatéria,
No calmo abraço nervoso
Da entropia criadora

Parecia o fim,
Mas era apenas começo

O gato e a neve

Era gato preto
Na neve branca,
Ou neve preta,
Num gato branco?

A sinfonia


Os que pensavam ouvir,
Pareciam surdos;
Os que eram surdos,
Pareciam ouvir

Duas velas

Uma vela
Luzia sem queimar;
A outra,
Queimava sem luzir

A montanha

Essa montanha
Era tão estranha:
Os que pensavam subir,
Embaixo ficavam;
Os que buscavam descer,
Ficavam acima -
Porque era estranha,
Essa montanha

domingo, 13 de dezembro de 2015

O Buraco

Havia a antiga lenda,
Mais esquecida que lembrada,
Do velho Buraco

Mais velho que o tempo,
Mais fundo que o mundo,
Mais sombrio que a treva,
Mais frio que o inverno,
Mais vazio que o silêncio,
Mais sozinho que a morte,
Mais estrelado que a noite,
Mais luminoso que o dia

Quem cai no Buraco,
Nada encontra,
Exceto a si mesmo

O tolo

Via sem olhar,
Ouvia sem escutar,
Refletia sem pensar,
Falava sem dizer

terça-feira, 8 de dezembro de 2015

Linchamentos

Lincha! Lincha! Lincha!
Vamos acabar com todos!
Todos, todos eles!
Não pode sobrar nenhum!
Lincha! Lincha! Lincha!