quarta-feira, 13 de outubro de 2010

A Torre

Poderoso senhor,
Samael mandava
Terras tinha,
Soldados tinha,
Servos tinha,
Moinhos tinha,
Ouro tinha,
Esposas tinha,
Sede tinha

Sede de saber
Sede de conhecer
Sede de ver

Sua ignorância torturava
Sua cegueira torturava

Queria saber,
Saber mais

Chamou sábios,
Chamou místicos,
Chamou viajantes

Ouvia,
Perguntava,
Aprendia mais, mais, mais!

Nunca era bastante

Os véus do universo ainda eram espessos
Queria ir além
Romper barreiras,
Segurar o fluxo do tempo, do espaço
Em seus dedos crispados
Agarrar o coração do cosmo,
Em suas mãos febris

Sonhou uma Torre

Uma Torre tão grande quanto o céu,
Alta como as nuvens

Veria longe,
Penetraria os segredos,
Seria o mestre

Iniciou as obras

Pesadas pedras vinham de longe
Arquitetos vinham do Levante e do Poente
Escravos, servos e soldados moviam-se como um rio
Nenhum braço foi poupado,
Nenhum pensamento foi esquecido

A Torre subia,
Subia,
E subia

Ultrapassou os minaretes,
As montanhas,
O vôo dos falcões,
As nuvens,
Chegou às estrelas

Samael consumiu fortuna,
Saúde,
Anos

A Torre estava pronta
Samael, febril, subiu os degraus
Penosamente escalou centenas, milhares de andares
Uma ascensão longa, solitária, dolorosa

Chegou ao parapeito
Debruçou-se,
Ávido, sedento, insano

Seus olhos percorriam o vazio
Queria ver!
Queria saber!
Queria conhecer!

Nada!

Olhou para baixo:
Via homens, casas, rios, montanhas,
Todo um Mundo,
Pequenino,
Como miniaturas,
Como formigas

Olhou para cima
Nada!

Apertou os olhos
Nada!

Esticou-se na ponta dos pés
Nada!

Seus olhos eram fracos
Sua mente era frágil

Não entendia os espaços que enxergava!

Queria ver a mão de Deus,
Não enxergava nada!

Ora, nada existe acima, então?!
Toda essa Torre, todo esse esforço, para nada?
Olhou para baixo novamente:
Rios, campos, homens, cidades...
"É só isso, então!"
Sorriu mesquinho Samael
"É só isso, então, nada além!
Nada além!
Sou senhor de tudo isso,
Entendo Tudo, Tudo!"
Riu Samael, insano

No alto, lá no alto,
Alguém sorria complacente
Os anjos viam e pensavam
No pobre Samael...

Era mísera formiga,
Sua Torre, mísero formigueiro...